domingo, 28 de junho de 2009

Sinais de vida no planeta Trânsito (ou Alegria de pobre...)


Nas eleições em 2010, um clichê mais que previsível se reproduzirá na cobertura da imprensa, no dia da votação. Sob a imagem das grandes filas diante das urnas, ouviremos repórteres falando sobre a “grande festa da democracia”. Não faltará a pedagógica entrevista como o velhinho de 90 e tantos que, apesar de não ser obrigado e coisa e tal, não abre mão de seu patriótico direito. Dia de festa.

Sempre achei isso uma coisa caipira, no sentido pejorativo do termo. Mas entendo. Em um país em que há tão pouco tempo (em uma perspectiva histórica) reconquistamos o direito básico de podermos votar, vá lá que uma eleição – algo tão rudimentar em uma democracia (até no Irã) – seja motivo de “festa”, ao invés de ser entendido como um procedimento regular e corriqueiro, que deveria começar, aliás, com o próprio direito de não votar.

Por que essa fala neste blog? Digo isso porque me senti, essa semana, ridiculamente “em festa” por ver a pavimentação de uma calçada entre a via L2, à altura do Cean, e a UnB, discutida aqui há algum tempo (a 1ª foto). Ela está ainda em construção, mas me parece que será uma calçada bem feita, possivelmente igual a que desejei no tempo que ia a pé para a UnB, à época da graduação nos anos 80, e durante a Pós, na década seguinte. Uma calçada, depois de tudo arrumado para a circulação dos carros, na reforma da L3, começada há mais ou menos dois anos. Uma calçada, enfim.

Alegrei-me, como tenho me alegrado ao ver uma calçada chegando ao lugar onde trabalho (a 2ª foto). Uma calçada cuja pavimentação, aliás, está se aproximando de uma baia para ônibus, projetada para um dia o transporte público poder parar no lugar que estuda o transporte público (...!).

Depois me senti meio idiota. O tal caipira. Senti, nesse misto de sensações, raiva e vergonha da minha felicidade patética. Vergonha dessa minha alegria subdesenvolvida de ainda ter que comemorar a construção de uma calçada. De achar o máximo estarem fazendo, finalmente, um espaço para a mais antiga, básica e representativa das modalidades de transporte.
“Mas ainda bem que resolveram fazer as calçadas, Victor”. “Antes tarde do que nunca...”. É verdade. Também sei ver o lado bom. Mas ainda assim não consegui, de todo, deixar de me ver comemorando bobamente a “festa” da democracia pedestre. Uma democracia como a eleitoral: incipiente e meio atrasada. Com muito chão pela frente. E de terra batida.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Do passe livre à tarifa zero

Este blog já abordou e defendeu a Tarifa Zero, com mudanças no financiamento do transporte público, de modo que não caiba ao passageiro arcar com os custos de implantação e operação do sistema.

Ontem à tarde, em entrevista à TV Globo, eu disse que a Lei do Passe Livre Estudantil, aprovada dois dias antes pela Câmara Legislativa, podia representar um passo importante na direção da Tarifa Zero para toda a população. Critiquei também os mecanismos de gratuidade atuais, que implicam no rateio dos custos correspondentes entre os passageiros que pagam tarifa.

Infelizmente, a edição da matéria que foi ao ar ontem à noite, no DFTV 2ª. edição, e agora há pouco, no Bom Dia DF, só aproveitou parte desta crítica, o que pode levar a entender que eu critico o Passe Livre Estudantil. O que eu realmente disse é que, se recursos públicos vão cobrir integralmente o Passe Livre, é preciso rever já, e para baixo, as tarifas praticadas hoje.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Aprovado o passe livre para estudantes no DF

A Câmara Legislativa do Distrito Federal aprovou nesta tarde o projeto de lei que assegura passe livre para estudantes. Confira notícia no portal da CLDF. Conheça mais sobre a luta pelo passe livre.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Votação do passe livre na Câmara Legislativa

Atenção para a postagem no Blog do Movimento Passe Livre do DF: amanhã, terça-feira 23 de junho, o projeto de lei do passe livre para estudantes será votado na Câmara Legislativa.

domingo, 21 de junho de 2009

Carro: Status ou elefante branco?

Por sugestão de um grande amigo (valeu, Gustavo!) recomendo a leitura do artigo abaixo. (Clique aqui para ler no original):

Carro: Status ou elefante branco?

Por Reinaldo Canto*

Já se passaram sete anos desde que, na mesa de um restaurante com amigos queridos, fiz uma comunicação que estarreceu a todos: vou ficar sem carro. Havia acabado de me separar e o reluzente Audi A3 ficou com a minha ex na divisão da partilha.

Os amigos se entreolharam e devem ter pensado: coitado, deve estar sem dinheiro; ou infeliz, desiludido da vida, separado aos 40 anos, a vida não deve fazer mais sentido.

Naqueles breves momentos, antes de se mudar de assunto para outros temas menos “chocantes”, percebi, nitidamente, que as pessoas me olhavam com ar de pena e que por pouco não recebi os pêsames, transmitido por vozes embargadas. Apenas argumentei que por morar próximo da Avenida Paulista, trabalhando no Greenpeace que, na época, localizava-se em Pinheiros, a vinte minutos de minha casa, não via necessidade de ter um trambolho de uma tonelada para me servir como meio de transporte. Concluí que ônibus, metrô e eventualmente táxis eram soluções mais econômicas e menos estressantes.

De lá pra cá não mudei de ideia e os meus compromissos profissionais não me obrigaram a ter e manter um transporte individual. E, nesse tempo todo, a situação do transporte em São Paulo também piorou muito, só corroborando minhas convicções.

Também quero deixar bem claro que não é por trabalhar com comunicação ambiental que abandonei o transporte individual. Seria uma atitude muito idealista e altruísta da minha parte se dissesse isso, mas também mentirosa. Na verdade, eu sou daqueles ETs que não gostam de carro. Sinto-me preso e estúpido dentro de uma máquina parada num congestionamento, sem poder simplesmente descer e sair andando no meio de motoristas irados. Já o transporte coletivo me permite tais atitudes de reação ao “saco cheio” do trânsito. Nessas horas, caminhar pode ser a solução.

Há uns dois meses, tive a grata satisfação de ler um artigo do Matthew Shirts, colunista do Estadão, em que ele falava exatamente disso. Da sensação de liberdade que passou a sentir ao abandonar o carro e sair caminhando pelas ruas da Vila Madalena. Ao encontrá-lo, trocamos rápidas impressões sobre o assunto que tem deixado de ser tabu. Afinal, até onde eu sei, o ser humano não nasce com quatro rodas!

Creio que, atualmente, tal atitude seja menos classificada como outsider, já que as condições de tráfego nos grandes centros pioraram exponencialmente. Numa cidade como São Paulo então, não resta dúvida quanto às dificuldades enfrentadas pelos motoristas.

No começo de abril, o caderno especial Origem/Destino, publicado pelo jornal O Estado de São Paulo, concluiu o que todos nós já sabemos por experiência cotidiana: o tempo usado nos deslocamentos vem aumentando constantemente. Hoje, esse tempo é de 70 minutos diários por pessoa. Em uma década, aumentou 10 minutos por pessoa. Se a isso somarmos o fato de que uma pesquisa sobre dificuldades de deslocamentos indicou que, entre 164 cidades do mundo, São Paulo ocupa o lugar 156, portanto, entre as mais complicadas de se andar, abrir mão do transporte individual deveria estar muito longe de ser considerada uma ação insensata.

Vale dizer que São Paulo ainda está à frente de duas importantes capitais nacionais (Florianópolis e Rio de Janeiro), consideradas pelo estudo mais caóticas e nas últimas posições da pesquisa.

E qual a tendência para o futuro? PIORAR MUITO!!

Quais as ações de políticas públicas no sentido de solucionar ou ao menos minorar essa situação? NENHUMA!!

Você imaginaria qual resposta seria dada por um alto executivo da indústria automobilística sobre o futuro do seu negócio? Alguém apostaria numa resposta diferente de “vender cada vez mais veículos”?

Quando a crise econômica se aprofundou, uma das mais rápidas decisões do governo brasileiro para enfrentá-la foi exatamente a redução do IPI dos veículos. Entenda-se tal medida como a da velha economia: produção e consumo aquecidos, manutenção dos níveis de emprego e nenhuma preocupação com os efeitos a longo prazo.

Além de entupir as ruas de nossas cidades e ampliar os níveis de poluição do ar, a cadeia de produção da indústria automobilística é intensiva em uso de energia, água e matérias-primas extraídas sem pudor nem dó da natureza. Isso significa que, do ponto de vista do planeta, essa atividade é totalmente insustentável e, portanto, sem futuro, seja pelo bem ou pelo mal.

Há muito tempo o carro deixou de ser um bem para se tornar uma commoditie. Em algumas classes sociais, já é comum trocar de carro como se troca de celular.

O Presidente Lula, em nome da velha economia, exulta o fato de integrantes das classes C e D, hoje, terem maior acesso a veículos. Isso é verdade, mas a que custo?

Não está na hora de mudarmos essa maneira de enxergar o progresso pessoal vinculado diretamente ao uso e trocas constantes de bens materiais?

Será que possuir um carro realmente significa status? Assim como determinados anúncios “vendem” a felicidade e o paraíso em forma de produtos de consumo?

Ressalto, ao final desse meu texto, que não farei uma afirmação como: “dessa água jamais beberei novamente”! Vou relutar o quanto puder, mas, se preciso for, irei comprar um carro. Portanto, sei também que muita gente precisa do carro até porque o nosso transporte coletivo não atende satisfatoriamente às necessidades das pessoas. O que peço, aos que por ventura me lerem, é que façam uma reflexão sobre o uso do transporte individual:

Você realmente precisa dele? Ok, precisa mesmo!

Você não poderia às vezes optar pelo transporte coletivo? Ou mesmo caminhar a pé? Ok, nem sempre é possível!

Tudo bem, mas pelo menos abandone a ideia de que um carro é um privilégio e um status. Basta você olhar para o interior dos outros milhares de veículos a sua frente, ao seu lado e atrás de você, nos imensos congestionamentos que você enfrenta diariamente. Será que ali, naqueles veículos, estão pessoas orgulhosas de seus status de motoristas imobilizados? Acho difícil.

A reflexão sobre essas questões talvez seja o primeiro passo que vá contribuir para uma verdadeira mudança de comportamento. Quem sabe um dia desses a gente não bata um papo numa caminhada pelas ruas de São Paulo? Você vai se surpreender com quanta coisa nova a cidade vai lhe mostrar. Isso sim é que é privilégio!!

quarta-feira, 10 de junho de 2009

No Correio Braziliense de hoje

(o artigo a seguir foi publicado originalmente no suplemento especial 'Educação no Trânsito', da edição de hoje do jornal Correio Braziliense)

ARTIGO
Educação para o trânsito ou no trânsito?

Paulo Cesar Marques da Silva*

“Educação para o trânsito” é o termo que aparece em todos os artigos do Capítulo VI (Da Educação para o Trânsito) da Lei nº 9.503/97, que institui o Código de Trânsito Brasileiro. Diversos outros dispositivos da lei trazem a expressão “educação de trânsito”, mas deixo de considerá-la aqui, não apenas porque seu significado parece um tanto obscuro, mas principalmente porque as definições, os objetivos e as obrigações relativas à educação, tal como em geral a entendemos, estão estabelecidos mesmo é naquele capítulo.

De certa forma, “educação para o trânsito” também é expressão consagrada pelo senso comum, o que, por isso mesmo, não pode ser desprezado. Mas o que realmente significa educar para o trânsito? Será que o que se entende por isso reflete os objetivos de uma política séria, capaz, por exemplo, de reverter o quadro dramático do número de vítimas que nosso trânsito produz? Uma reflexão sistematizada sobre a questão certamente requereria mais espaço e o concurso de estudiosos mais especializados nos fundamentos pedagógicos do que é capaz de fazer um profissional da engenharia, ainda que lidando com o ensino e a pesquisa. De todo modo, arrisco a ponderação que segue.

Não duvido que grande número de pessoas associe à noção de “educação para o trânsito” a formação adequada de condutores de veículos. Não por outro motivo, muita gente entende que as Escolas Públicas de Trânsito, referidas no artigo 74 do Código, não são mais do que autoescolas, de preferência gratuitas, a serem mantidas pelos órgãos executivos de trânsito. Mesmo que nossos interlocutores rompam os limites dessa equivocada interpretação, dificilmente enxergarão na “educação para o trânsito” algo muito diferente do ensino-aprendizagem de um conjunto de regras que inevitavelmente reproduzem o ambiente das cidades cujas ruas, ao longo do último século, deixaram de ser o espaço público de circulação e de encontros de pessoas para se tornarem território ocupado pelo despótico império do automóvel.

Entretanto, se quisermos resgatar os princípios e diretrizes da Política Nacional de Trânsito, aprovados em 2004 pelo Contran depois de uma série de eventos que os discutiram nas principais áreas metropolitanas brasileiras, precisamos pensar a educação de forma diferente: menos de modo meramente normativo e mais como fator de emancipação e de promoção da cidadania. Assim, as pessoas poderiam protagonizar a construção de um ambiente de circulação verdadeiramente público, seguro e inclusivo, destinado a uma convivência social democrática. Ao mesmo tempo, teríamos a oportunidade de produzir uma ambiência propícia ao desenvolvimento de relações humanas em geral mais civilizadas, com mais respeito à coletividade.

Aí, sim, começaríamos a recuperar a dimensão transformadora da realidade que a educação tem, mas perde quando é reduzida a um instrumento de reprodução e conformação ao status quo. Talvez um passo significativo nesta direção possa ser dado com a substituição, não necessariamente na lei, mas essencialmente nos programas e ações, da “educação para o trânsito” pela “educação no trânsito”. E, naturalmente, para todos!

* Engenheiro, Doutor em Estudos de Transportes pela Universidade de Londres (University College London) e Professor do Programa de Pós-graduação em Transportes da Universidade de Brasília.